Onde estou eu ? Uma crónica sobre a abordagem centrada na Pessoa com demência

Acordo sobressaltado com um barulho de fundo. É uma conversa. Não percebo muito bem de onde vem nem quem está a conversar, mas consigo entender que estão a falar sobre vestidos. Deve ser a minha mulher. Olho em volta, à sua procura, mas não a vejo. Apercebo-me então de que não estou em casa. Mas afinal, onde estou eu? Vejo uma senhora a passar e chamo-a:

– “Olha! Olha!”

Não obtenho resposta. Continuo sem saber onde estou. Mas afinal como é que eu vim aqui parar? Levanto-me da cadeira e vou atrás da senhora. Pode ser que ela me saiba explicar que sítio é este.

– “Olhe, desculpe, sabe-me dizer onde estou?”, pergunto-lhe.

Ela fica a olhar para mim e continua sem me dar resposta. Dá-me a sensação que não percebeu. Pergunto-lhe novamente onde estou. Desta vez, ela dá-me uma bolacha para a mão. Não percebo porque me deu a bolacha, mas agradeço-lhe. De seguida, ela vai-se embora, deixando-me sozinho e sem a resposta de que preciso. Resolvo então explorar este sítio novo. Começo a andar e deparo-me com um grupo de pessoas que estão a conversar. Talvez me possam ajudar. Dirijo-me até elas e pergunto-lhes onde estou. Todas ficam especadas a olhar para mim, mas nenhuma me responde. Uma destas pessoas diz para eu me ir embora dali. Mas o que fiz eu para me mandarem embora? “Porque não posso estar aqui?”, pergunto-lhes. De súbito, e antes que alguém me possa responder, sinto agarrarem-me no braço.

– “Vá, saia daí. Deixe esse senhores em paz”.

É uma senhora que me diz isto. Acho que já a vi antes, mas não tenho bem a certeza. Leva-me para uma cadeira onde diz para eu me sentar. Tento explicar-lhe que não me apetece sentar, mas ela não parece compreender e obriga-me. Isto já começa a irritar-me! Não percebo que sítio é este, nem porque aqui estou e agora obrigam-me a ficar aqui parado. Eu devia era estar no trabalho. Lá é que eu sou preciso. O melhor é mesmo ir já para lá.

Levanto-me, então, e dirijo-me para a porta. Ponho a mão na maçaneta e rodo-a, mas a porta parece não abrir. Tento mais uma vezes, mas é em vão: a porta continua sem abrir. Não pode ser! Eu tenho mesmo de ir embora, senão sou despedido! Grito que me ajudem a abrir a porta, mas ninguém parece ouvir. Tenho que sair de qualquer maneira. Se for despedido, quem paga a comida e a escola do meu filho?! Começo a pontapear a porta. Tenho mesmo que sair! No entanto, não consigo: sou agarrado por dois homens que não conheço de lado nenhum. “Deixem-me”, digo-lhes, “eu tenho de ir trabalhar senão sou despedido! Não percebem?!”. Mas eles ignoram-me e uma vez mais obrigam-me a sentar na cadeira. Só que desta vez usam uma espécie de cordas para me prender os braços. Tento soltar-me, mas não consigo. E agora como vou conseguir pagar as contas, se não posso ir trabalhar? O desespero apodera-se de mim. Começo a chorar…